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terça-feira, 14 de setembro de 2010

Entrevista feita por mim com a cineasta Susanna Lira, diretora do filme "Nada sobre meu Pai", para o site www.tudozen.com




“A primeira forma de reconhecimento é aquela que se realiza na esfera privada, na intimidade, expressando-se no afeto e se traduzindo em confiança em si, em consciência do valor da própria existência”, de Hegel.

No site de divulgação de “Nada sobre meu pai”, a frase é reveladora.

Susanna Lira, diretora do filme que aborda a questão da ausência do pai no Brasil, uniu jornada pessoal à profissional e pesquisou durante quatro anos o tema, culminando na película que tem estréia prevista para 2011.

Entre a edição de um filme e lançamento de outro (veja no final da matéria), Susanna conseguiu atender por e-mail o TudoZen, para uma conversa rica e conscientizadora.

TZ: Na sua visão, a que se deve, principalmente, esta atitude de muitos pais sumirem, não reconhecerem e nem participarem da vida dos filhos? A mãe pode fazer algo, em alguns casos a este respeito?


SL: Eu entendo a ausência paterna como um fator histórico que foi evoluindo para um estado cultural. Hoje, o fenômeno da deserção paterna está naturalizado em nossa sociedade. É um mal social que atinge primeiramente a mãe, depois o filho e por fim toda a sociedade. Nós mulheres é que educamos nossos filhos homens e acho que parte da solução desta questão pode estar em nossas mãos. Instruindo o filho a ser um homem-cidadão, solidário e capaz de sentir compaixão pelo próximo, seria um dos primeiros passos para diminuir o número de pais desertores. Por outro lado, a mulher que fica sozinha com o filho deve buscar os direitos dessa criança para que ela tenha ajuda desse pai em todos os sentidos, e não somente auxílio financeiro. Muitas vezes mulheres que foram rejeitadas pelos parceiros excluem a figura do pai por mágoa e raiva. Mas são coisas que devem ser tratadas de formas diferentes. Para um homem ser pai do seu filho ele não necessariamente tem que ter uma relação afetiva com você. A falta de entendimento disso muito vezes impede a relação pai e filho.

TZ: Como é para a mãe explicar aos filhos a falta do pai?

SL: Contar a verdade é a melhor forma. Foi assim que minha mãe agiu comigo e isso me fez um ser humano saudável emocionalmente e capaz de lidar com minhas dificuldades sem culpabilizar o outro. Sei que pode ser bem cruel falar para uma criança que ela foi rejeitada e abandonada pelo pai, mas é melhor do que ela criar uma fantasia de que esse super-herói um dia surgirá para livrá-la de todos os problemas. A vida não é assim. E viver com essa ausência é um desafio para se construir como pessoa.

TZ: Você poderia nos explicar o ponto de partida pra você fazer o filme?
 
SL: Aos 7 anos de idade minha filha Pilar estava fazendo um trabalho escolar onde ela teria que construir sua árvore genealógica. Cada parente tinha uma folhinha com a foto. No lado do meu pai não tinha nada e por conseqüência tios, avós e bisavôs paternos também ficaram ausentes. Ou seja, a árvore ficou “desfolhada”. Ela ficou desolada e levou o trabalho para escola. E com certeza foi o que mais chamou a atenção da turma. Pela primeira vez visualizei a materialização da ausência paterna. Metade da árvore genealógica da minha família era um imenso vazio. Para buscar uma resposta para ela, decidi investigar melhor as causas e conseqüências deste vazio que afeta milhões de brasileiros no mundo. Foi assim que surgiu o filme.

TZ: Você nunca soube nada mesmo a respeito do seu pai? Sua mãe nunca disse nada? Mesmo com a ausência dele, você gostaria de conhecê-lo? Por quê?

SL: Não sei NADA SOBRE MEU PAI. A única coisa que achava que sabia dele, que era o nome, foi constatado que ele não declarou o nome certo para minha mãe. Sei que ele é equatoriano, é só! Nunca vi nenhum foto e nunca consegui nenhuma outra informação.
Minha mãe disse tudo que sabia, e infelizmente é quase nada. Não guardo mágoa e não tenho rancores, mas acredito que pouco me acrescentaria conhecê-lo agora. Eu sou feita por essa ausência. Talvez se ele surgisse na minha frente agora me causasse uma desconstrução desnecessária.

TZ: Acredito que tudo pode acontecer nessa vida. Uma amiga em janeiro último reviu seu pai que não via há mais de 30 anos. Ele a procurou pela internet, fez contato e conseguiram se encontrar. Baseado nisso, será que podemos fazer um exercício: Se você encontrasse seu pai, ou se, pelo menos, por exemplo, ele lesse esta entrevista, o que você gostaria de dizer para ele? 


SL: Seria uma grande contradição eu declarar aqui que não quero conhecer meu pai. Na verdade, já até procurei por ele. Quando digo que pouco me acrescentaria conhecê-lo agora, falo em nome de milhões de filhos que nunca vão encontrar os pais e terão que conviver com essa ausência para o resto da vida. Aceitei essa ausência como parte da minha história, e deste vazio estou realizando um filme. Estou fazendo o que está ao meu alcance para que mais pessoas não sejam atingidas pela falta de um pai.
Agora, fazendo o exercício proposto por vocês, se eu encontrasse meu pai agora, o que eu diria para ele? Acho que na verdade esse trabalho de 5 anos de pesquisas e filmagens em torno deste tema, no fundo é um grande discurso subjetivo que preparo inconscientemente para ele. Na voz de outros filhos compartilho minhas fragilidades e sentimentos.


TZ: Em que exatamente você acha que ficou privada na vida com essa ausência paterna?

SL: Uma das bandeiras que quero levantar no filme é a importância do pai. Se os homens soubessem o quanto eles são fundamentais e o quanto eles fazem falta em todos os momentos na vida de um filho haveria muito menos desertores.
Para cada pessoa a figura paterna faz uma falta diferente. Encontrei pessoas que queria o pai presente para apenas jogar bola, outros para pedir dinheiro para comprar um brinquedo, outros queriam o colo paterno e uns apenas para poder chamar alguém de pai.
Acho que eu sinto mais falta na hora de compartilhar minhas alegrias. 


TZ: Você sente que uma das ferramentas para fazer “do limão uma limonada” com a situação do pai ausente, é ajudar seu marido a ser o melhor pai possível para sua filha? 

SL: Com certeza nós mulheres podemos ser boas mediadoras nesta relação pai e filho. E tudo começa quando abrimos espaço para que esse homem exerça sua paternidade. É fundamental expressarmos ao homem-pai o quanto ele é fundamental e importante na vida daquele filho. O meu filme pretende ser um convite amoroso à paternidade. 

TZ: Pode nos narrar alguma história que tenha te tocado profundamente (das histórias pesquisadas para o filme).

SL: Uma das histórias que mais me emocionou foi de um porteiro em Brasília. Ele passou por maus momentos na vida, envolvido com drogas e com o crime. Conseguiu se salvar quase por um milagre. Hoje ele tem um filho de 7 anos, a quem ele chama de “pai”. Ele chama o filho, que é uma criança, de pai, pois sente falta de chamar alguém de pai. Achei isso muito forte, pois demonstra como a ausência paterna pode ter conseqüências tão sutis, ternas e delicadas.

TZ: Existe algo que se possa fazer para atenuar o sentimento de vazio em comemorações como a do dia dos pais? (tanto a pessoa que não tem pai como qualquer pessoa sensível a essa situação)

SL: Cada um tem modo de lidar com suas emoções. Eu tento me divertir com meu “caos”. No dia dos pais saio para descontrair e comemorar minha vida. Afinal, mesmo a contragosto de alguém estou aqui viva e provocando as pessoas com meu trabalho. Tenho certeza que sou uma pessoa íntegra e quem mais saiu perdendo nesta história foi meu pai, que perdeu a chance de viver uma linda história de amor comigo. Pode parecer estranho, mas é como consegui superar. As mães sozinhas têm muito receio nessas datas, pois sabem que os filhos passarão por constrangimentos e momentos de solidão. E é verdade. Mas essa é a história deles. Esses sentimentos também fazem parte da vida. Eles só terão que aprender a lidar com isso mais cedo que o resto do mundo.


TZ: Fez terapia? Acha interessante que as pessoas neste caso façam?

SL: Nunca fiz terapia, mas acho muito importante. A questão da ausência paterna não necessariamente leva o filho para o divã, mas as conseqüências deste “vazio” têm se tornado cada vez mais evidentes em nossa sociedade. Acho que tanto os filhos quanto os pais desertores deveriam buscar tratamento. Os homens que vão embora e deixam aquela mulher sozinha com um filho deveriam buscar ajuda para entender o porquê de tanta falta de solidariedade, de tanto desamor. Afinal parte deles fica no abandono. Esse desapego deve ser tratado, pois gera uma infinidade de dissabores para todos os envolvidos.

TZ: Você teve contato com homens que não tiveram pais e são pais? Como eles agem na educação sem essa referência paterna?

SL: Sim tive. E é bonito de se ver. Pois a maioria deles se torna pais muito dedicados e amorosos. Ouvi muitas vezes: “Eu sou o pai que eu gostaria de ter tido”. Mesmo sem a referência em casa, eles aprenderam vendo tios, vizinhos, avôs exercendo a paternidade. E eles procuram aprimorar tudo àquilo que viram e também buscam suprir a falta que sentiram ao longo da vida. Só quem não teve um pai é que sabe a falta que isso faz, por isso eles procuram estarem presentes.

Contatos com Susana Lira podem ser feitos através do site: http://www.modooperante.com.br/

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Trip Colaborativa - Carta para daqui há 10 anos - Carta para mim mesmo

E aí parceiro?

Não tem problema eu mesmo escrever o que eu mesmo vou ler porque a minha memória, ou melhor, a minha vaga lembrança, ah, há de esquecer!

Neste momento, quero dizer o meu momento, eu-escritor, não o seu momento, eu-leitor, uma década separa nossos eus (se é que ainda existirão).
Acredito que a Terra ainda deva girar, mesmo que haja uma certa dificuldade em se sustentar, pois não sei se o seu eixo corre risco de se derreter com os calores que já deve suar...
Diz-me aí, o que tem feito?
Que músicas tem escutado?
O que tem lido, bebido, mastigado?
Tens namorado, transado ou ainda fica na caverna, ensimesmado?
Mesmo que não tenha evoluído tanto quanto as tecnologias, eu não espero estar aí para ter tuas respostas (o que escreve não mais existe, me compreende?).
O que ainda existe?
Meu Deus, será que você existirá para dar vida ao que escrevo, ou escrevo palavras mortas que não serão lidas...nem significadas...nem sequer....visualizadas por quem não as pode compreender, ou pior (pensamento demente), serão vistas por outros olhos, outras lentes, outras mentes, outras...
Devo desistir, apagar tudo?
Não, não apagarei, assim como não podemos apagar nada do que acontece na vida.
Não há borracha para a realidade, apenas mais tinta...e vontade.
Mais tinta e mais vontade.
…......................................
…......................................

Ainda está aí?
Ou dormiu...ou estás a rir??

Pois é, era você, que era assim...

Trip Colaborativa - Carta para daqui há 10 anos -Carta para meu filho

Filhão!
Agora mais ão do que nunca hein?
Duplo parabéns!
Duplo porque hoje, quando você lê esta carta, está comemorando 18 anos, mas ao mesmo tempo também hoje, quando eu a escrevo, comemora 8!

Eu gostaria muito que, neste período, os israelenses e palestinos tenham conseguido se perdoar, mas, se isso não tiver sido possível, que você possa ter perdoado seu melhor amigo, em algum eventual escorregão.

Eu gostaria muito que neste período, tenham terminado todas as guerras, mas se isso não tiver sido possível, que você só tenha sido violento com, no máximo, alguns mosquitos amazônicos e ainda assim, em em total legítima defesa.

Eu gostaria que não houvessem mais drogas no mundo, mas se isso não tiver sido possível, que o seu primeiro porre tenha sido motivado pela alegria e irresponsabilidade inocente junto à amigos verdadeiros (ou quem sabe, comigo...).

Eu gostaria muito que todas as pessoas tivessem suas casas, mas se isso não tiver sido possível, que pelo menos todos os pais possam ter tido um acampamento como o nosso naquele feriado.

Eu gostaria muito que não existisse mais fome nem analfabetismo no mundo, mas talvez eles nunca deixem de existir, assim como nossos fantasmas internos (você já deve conhecer alguns não é?).

Ah, eu gostaria muito que nossas brincadeiras de quando começaram a crescer seus pelos e do seu primeiro barbear permanecessem eternizadas, como as nossas partidas de futebol de antigamente.

Espero que agora, adulto, você, mais do que ter dinheiro, possa saber reconhecer o seu valor e o dos outros.

Que mais do que um milhão de contatos nas redes sociais você possa ter amigos presentes, reais.

Que mais do que a posse de tecnologia e suas inovações, você tenha seus princípios, e que os mesmos não se tornem suas prisões.

Que além do rock´n´roll (ainda existe filho?), você se dê pitas de silêncio e meditações.

Que se você já souber qual será sua profissão, que ela seja uma ponte entre tua razão e coração, e se ainda não souber, relaxa, tem muito chão.

Que eu possa escutar com você, os seus flash-backs favoritos, quando pintar o primeiro amor, e também falar do meu...ah e que o seu seja superior.

Filhão, espero mesmo ter conseguido implantar em seu chip , tudo o que precisar, para que possa ter...uma “GOOD TRIP”!

Trip Colaborativa - Carta para daqui há 10 anos - Carta para um Amor Impossível

Pensei em deixar para te escrever depois, porque queria começar esta carta de forma diferente do que um simples oi.
Se tivesse seguido esse pensamento, iria até o “São Google” e pesquisaria o modo de se cumprimentar em outras línguas, outras culturas, desde possíveis tribos indígenas isoladas (?) na Amazônia até comunidades undergrounds européias ou dialetos de grupos nômades dos desertos africanos ou até quem sabe, uma gíria do momento doa baladeiros neozelandeses.
 Percorreria o mundo para tentar entrar no seu...

Mas decidi escrever agora, já, sem nenhum recurso tecnológico ao alcance a me anexar dados tão instantâneos que chegam a me soarem falsos.
São dez horas da manhã.
Há dez anos atrás, que é quando efetivamente escrevo estas palavras, tivemos nosso último contato.
Você havia acabado de se separar e me chamou em uma janela do msn.
Dizia que estava péssima (claro, pra me chamar....).
Dúvidas, cicatrizes abertas e incertezas de rumo eram as suas companheiras naqueles dias.
Vou confessar: por trás de minha aparente amizade e tentativa de lhe confortar e motivar, eu estava muito feliz!
Sim, fui egoísta, my darling, deveras.
Afinal, o menino que a conheceu e se prostrou encantado, em meus tenros dez anos de idade, ainda vivia em mim.
E nesse menino, o sentimento, arrefecido ou escondido, igualmente persistia vivo.
Eu ainda te amava.

E naquele instante, enquanto você desabafava que seu ex-marido isso, que seu ex-marido aquilo ou aquilo outro, eu era sugado em minhas conexões neurais por uma espécie de êxtase, como uma tela interna de cinema sendo projetada pela imaginação desenfreada, criando as formas desse nosso encontro.
Claro, era nosso destino, traçado nas maternidades ou eternidades, eu e você, nascidos um para o outro.
Eu te consolaria, escutaria, e para ouvir melhor...te abraçaria (sim, te ouviria melhor assim, com nossas orelhas quase juntas).

Suas lágrimas cairiam, criando um mínimo riacho na superfície de tua face.

Num brevíssimo segundo, depois que eu a contemplasse, faria com meus lábios, de teu riacho, um lago, eu teu olhar, então, da profundeza desse lago, dentro do meu, de todos os meus eus; e eles, todos os eus, unidos no beijo, único, singular, divisor de águas em nossas vidas e , incoerente, semente de multiplicação de nossas carnes.

Como eu queria ler seus olhos lendo esta carta.
Está com raiva? Indiferença? Ou...está...gostando...?
Sei que tudo isso não deve fazer o menor sentido para você.
Muitas coisas mudaram.
O clima está mais quente, algumas geleiras realmente derreteram.
Seus pais ainda estão vivos?
Você teve filhos?
Tem alguma peça de roupa antiga guardada?
Muitas coisas mudaram.
As gírias, os programas da televisão, as músicas, a realidade, os sonhos...
Bem, caso você esteja separando novamente...meu sonho de ser teu sonho...foi um sonho bom viu?

PS.: “Tashi Delek” (cumprimento tibetano que significa Que tudo corra bem) e "Vertu sæll" (cumprimento islandês que significa Seja feliz).