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quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Um conto Luso-Brasileiro

Como torcedor da Lusa, uma das coisas que pensei assim que soube que estava grávido de um menino, foi em levá-lo comigo aos jogos no Canindé, repetindo o melhor passeio que meu falecido pai me proporcionara na minha infância.

Meu velho me uniformizara inteiro e me colocava para entrar em campo, como mascote, junto com os jogadores, sensação de prazer indescritível (mesmo para um estudante de jornalismo, com o trabalho de descrever as coisas...).

Quando o filhote - e os desafios da paternidade – foram crescendo proporcionalmente, comecei a refletir sobre o real valor dessa “herança” que já ia colocar em seu caminho, sem que ele tivesse a possibilidade de aquiescer conscientemente essa escolha externa ou de negá-la, preservando uma das características mais inatas dos filhos em geral: a rebeldia.

Precisei então, fazer uma contemplação do que era exatamente, ser um torcedor da Lusa, para poder eu, sim, conscientemente, tentar fazer essa escolha por ele.

Me dei conta que eu, totalmente conformado e ciente do folclore que se tornou ter essa identidade de torcedor lusitano, torcerei por esse time até findar meus dias. Mas também percebi que não gostaria de instalar um cabedal de tanto sofrimento no meu amado.

Diante de algumas circunstâncias específicas, como o fato da irmã e namorado da mãe serem corintianos (única liberdade que não quero lhe conceder...) comecei a fazer um lobby para ele se tornar são-paulino, me baseando em seu gosto pela figura do Rogério Ceni e no fato deste ser o time da mãe, além do repertório vencedor deste clube.

Tudo vai bem nesta empreitada, mas tivemos um capítulo especial quando do primeiro jogo do campeonato paulista, quando se enfrentaram lusa e tricolor.

Como ele pediu muito, o levei ao Morumbi, e óbvio que ele quis ficar na torcida do São Paulo, uma vitória para meu lobby, mas uma sensação estranhíssima de estar o jogo inteiro num lugar que não é meu.

Quando o Fábio defendeu o pênalti cobrado pelo Rogério, quase pulei, em perfeito eco e ressonância com meu verdadeiro “povo”, que exultava de alegria no outro lado das arquibancadas.

Ao final do primeiro tempo, fora a sensação de estranheza, tudo “ia bem”, o São Paulo ganhando, meu filho feliz, eu feliz de estar proporcionando uma vontade dele, e uma derrota para meu time que era previsível e perfeitamente contornável para o decorrer da competição.

No entanto, no segundo tempo, outras estranhezas esperavam a vez de me sobressaltar.

Eis que a Lusa começa pressionando, um, dois, três escanteios a seu favor e de repente, empate!

Meus amigos “sofredores”, mas, incorruptivelmente fiéis, geograficamente (mas não internamente) separados de mim pela vontade paterna de fazer o melhor, pulando, comemorando e eu fazendo o mesmo (tb internamente...).

Um empate deixaria tudo em harmonia.
Eu e meu filhão, felizes.

Mas era dia da surpresa.

A lusa continua jogando bem, encarando de igual para igual um adversário tecnicamente superior, atacando mais, e fruto disso, vira o jogo, 2x1 !!!

Estranheza...pelo placar...pela briga íntima de querer gritar gol e estar completamente impossibilitado disso - instinto versus sobrevivência -, e o elemento novo de perceber uma certa frustração com o resultado em meu rebento ao lado.

Se fosse um dia normal, o São Paulo pelo menos empataria a partida e tudo então voltaria...ao normal...eu meu filho felizes e coisa e tal.

Mas era um raro dia de combinação entre competência do time e sorte, e o Dagoberto arrumou uma expulsão que foi vital para o triunfo rubro-verde.

Neste momento eu já não sabia se torcia (mas torcia...) pra Lusa segurar a vitória, ou se torcia pro São Paulo empatar, pro meu filho voltar a sorrir.

Quando o Hevérton, em dia de gala, fez 3x1, não só decretou a vitória heróica da Lusa, como também meu passaporte para meu Céu e Inferno interior.

A minha torcida, pulava, mas PULAVA, assim mesmo, em letras maiúsculas.
E meu filho murcho, murcho, triste mesmo pela derrota do seu time.

Talvez ele goste um pouco mais da Lusa, por vê-la jogar bem
Talvez goste menos ainda, por ter imposto uma derrota ao seu time.

Talvez eu esteja fazendo o certo, talvez o errado, talvez, talvez; no meio dessa gangorra emocional entre heranças e responsabilidades paternas, só uma certeza, no título de uma música cantada por...Roberto Leal:

“Que bela a Vida”!