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terça-feira, 30 de setembro de 2008

O Povo Brasileiro – Darcy Ribeiro

Este livro é uma verdadeira aula prática de história do Brasil, uma vez que nos envolve de tal maneira, que praticamente nos coloca dentro das situações descritas, vivendo as experiências narradas com um talento digno de louvor.

Ao mostrar as circunstâncias em que se deu o gênesis da formação do brasileiro, como um povo, uma realidade brutal emerge de suas páginas.

Embora tivesse uma pequena noção das barbaridades cometidas pelos portugueses no chamado “descobrimento” do Brasil, senti minha consciência sendo tomada de assalto, como se a clareza com que o autor partilha seu profundo conhecimento a despertasse visceralmente, mesmo ainda intoxicada e nublada pelo aprendizado (?) dos tempos de colégio, onde nos foram instalados softwares de um ponto de vista exclusivamente europeu da questão.

A falácia da evangelização de almas ímpias, perdidas, que serviu de base e fachada para os verdadeiros motivos do tal descobrimento (Invasão?), ou seja, a ganância, o dinheiro e o poder, mesmo que obtidos através de uma violência crua, cruel, perfeitamente traduzível na palavra escolhidas para denominá-los: selvagem.

Darcy Ribeiro escreve em dado momento, que esta nossa colonização, conseguiu a proeza, a façanha extraordinária de formar um povo novo “deseuropeizando os brancos europeus, destribalizando os índios e desafricanizando os negros”.

Nossa origem foi construída em cima de uma degradação singular, que violou todas as essências envolvidas.

Considero esta leitura, uma das melhores coisas que fiz na minha vida.

É possível entender melhor o país de hoje pelo país de ontem.

Conhecendo-o melhor, sua política e sua cultura, intrinsecamente fluída em nosso sangue, nos conhecemos melhor também como pessoas.

Assim como se fosse mais uma peça do nosso quebra-cabeça individual, absolutamente ligado ao mosaico coletivo.

RIBEIRO, Darcy - O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995

Seção Correio da Boa Notícia

Com o título extremamente apropriado de “Pequena Gigante”, leio na Revista Vida Simples, edição 70, de set/2008, em reportagem assinada por Marcia Bindo, uma dessas matérias nas quais sinto que o Jornalismo realmente vale a pena.

Nela, somos agraciados, com a história de uma mulher tailandesa, cuja vida é dedicada a cuidar de elefantes maltratados em seu país, chegando à criação do Parque Natural dos Elefantes, um espaço na floresta que a permite cumprir melhor sua vocação.

Marcia Bindo relata as torturas e a exploração a que são submetidos esses animais.

O salvamento de um deles, em especial, provoca dupla emoção: de tristeza, pela forma que nós, humanos, agimos em algumas circunstâncias e, por outro lado, de admiração, pelo trabalho belíssimo de abnegação, que podemos também realizar.

Comprem, leiam, enriqueçam-se com esta fábula real, dessa verdadeira “Irmã Franciscana” junto aos nossos “Irmãos, os Elefantes”.


http://vidasimples.abril.com.br/edicoes/070/personagem/conteudo_294301.shtml

Muitíssimo Prazer, Nélson Rodrigues

“O óbvio ululante” é um livro que reúne crônicas escritas por Nélson Rodrigues, entre os anos de 1967 e 1968, publicadas no jornal O Globo.

Exceção feita ao filme “Os sete gatinhos”, que assisti no início da adolescência, ou seja, com olhos demasiadamente púberes para poder ver algo além da sensualidade cativante da Lucélia Santos, não conhecia nada do referido autor.

Confesso que havia comprado este estigma pejorativo incutido em algumas camadas da mídia, de relegar seu trabalho a uma prateleira de pornografia – que acredito nada tenha a ver com sua auto-definição, mesclada de contraste e complexidade, de ser um anjo pornográfico.

Céus, que engano!

Minha ignorância encoberta pela vergonha (assunto bem “rodrigueano” hein?) quis até me impedir de escrever.
Mas inspirado por seu texto, resolvi não ter vergonha de mostrar minha imbecilidade, assim quem não sabe não descubro um gênio...

As crônicas que li, são, ululantemente, geniais.

Uma visão terrivelmente sagaz das agruras da personalidade humana, como se Nélson enxergasse a todos por detrás das máscaras de civilizados, de bonzinhos, de arautos de um comportamento tão idealizado quanto longínquo de ser alcançado.

E tudo, com humor, muito humor.

Às vezes, cínico humor, que reconhecemos e nos faz rir de olhos fechados; rir no nosso escuro, com o semblante pego em flagrante, como se estivesse olhando pelo buraco da fechadura de uma castidade irreal, uma vez que fruto da repressão e não da sublimação dos instintos.

Ah, pelo pouco que foi lido, óbvio ululante que não posso dizer que conheço sua obra.
Mas já é possível, pelo menos, trocá-la de prateleira.
Acho que daria um bom papo com Freud, talvez.

O óbvio ululante — Primeiras confissões, "Companhia das Letras", São Paulo, 1993. Seleção: Ruy Castro