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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Milagres do Haiti

Tragédias podem ser pessoais ou coletivas.

Ambas advém de fenômenos naturais, sejam provenientes das profundezas da terra em que pisamos e criamos a divina comédia e drama humano, ou dos mecanismos invisíveis que governam a própria existência e a vida, entre eles, sua antítese (ou complemento), a morte.

O mundo acaba muitas vezes para cada um de nós.

Num trauma instalado na infância, numa violência sofrida, no fim de um relacionamento, na morte de um ente/amigo querido e tantas outras mazelas.

Não sei de quem é a frase: “A dor é inevitável, o sofrimento, optativo.”.

Há quem seja derrotado e deixe sucumbir sua trajetória evolutiva e há quem, após um mergulho profundo na dor, a absorve, cicatriza e transforma em combustível para uma nova etapa na jornada, melhor e mais rica que a anterior.

Por mais que estejamos, em maior ou menor escala, um tanto anestesiados em sentir a dor do outro (ou por uma parcela de egoísmo, ou por mera falta de tempo ou pelo excesso de informações que chegam através dos veículos de mídia), tragédias em que um número muito grande de pessoas é vítimas ainda chocam, ainda nos permitem ligarmo-nos ao outro, mesmo distante geograficamente, provocando uma sensação de compaixão, uma vontade/necessidade de ajudar, seja em recursos financeiros e materiais, seja simplesmente em forma de oração.

Apesar de todo o stress da modernidade e de um sem-número de distrações supérfluas em que estamos inseridos, essa compaixão mostra que ainda estamos acordados, que ainda somos uma humanidade.

É impossível não nos surpreendermos com alguns fatos positivos e até mesmo, alguns Milagres, que se manifestaram em meio aos destroços causados pelo terremoto no Haiti.

Especialistas sempre dizem que o máximo que uma pessoa poderia suportar, em condições extremas como essa, seria um tempo variável de 3 a 4 dias.

No entanto, uma semana depois do violento tremor, uma semana embaixo dos escombros, foram resgatadas com vivas uma senhora de 69 anos de idade e uma criança, recém-nascida, de vinte e poucos dias de vida.

Alguns jornais mais ousados chamaram isso de pequeno...milagre.

Pequeno???

Uma criança, de vinte e poucos dias de vida, com pouco ar, sem o leite da mãe e nenhuma alimentação substituta, sem água, sozinha, sem nenhuma ajuda, resistir uma semana?

Lembrei-me da adolescente francesa de doze anos que, em julho de 2009, foi a única sobrevivente da queda de um avião que viajava de Paris para as Ilhas Comores. Cento e cinqüenta e três pessoas morreram e ela, apenas ela, escapou.

A Existência vai assim, em meio a toda a racionalidade, salpicando o cotidiano de milagres (de vários tamanhos...) e nós, se estivermos distraídos, não os percebemos, não os reconhecemos.

Às vezes parece que esses Milagres, tal sua magnitude, são direcionados àqueles que são mais céticos.

Aos mais “crentes” em algo superior, mais românticos talvez, bastaria os exemplos de pequenos milagres cotidianos, que acontecem com todos a todo instante, ou milagres de envergadura um pouco maior, como vivermos todos em um planeta-bola absolutamente solto no espaço, sem nenhum cordãozinho pra segurar!!!

Afinal, mesmo sendo explicável pela ciência...isso também não é um Milagre?

Obs: texto escrito antes de serem encontrados sobreviventes 15 dias após o terremoto ter acontecido. O que só reforça o mesmo.

A Charge é do Dalcio, do jornal Correio Popular, de Campinas.

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